quarta-feira, abril 11, 2007

Ameixas

A ameixeira nasceu aqui. Cresceu aqui. Aqui nesta casa onde vivo. Não tem varanda, não é nada de especial. Não é especialmente dotada para que árvores despontem aqui. Não foi preciso muito... um pequeno canteiro, alguma terra e seis caroços de ameixa vermelha enterrados nela. Água à mistura com alguma regularidade. E tempo... tempo esse que é o que mais disponho. Na primavera do ano passado ela brotou da terra. Um pequeno ser verde apareceu do castanho daquele canteiro e nasceu. Falei disso por aqui já lá vai um ano.
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A ameixeira cresceu... e cresceu mais do que eu pensava que poderia crescer. Em Setembro parou e permaneceu estável durante o Inverno. Cerca de um metro e sessenta centímetros. Agora que a Primavera começou a fazer os seus efeitos chegou o momento da decisão... ou ficava mais um ano por cá e arriscava-me a ser impossível transportá-la para a santa terrinha ou ia já para lá.
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Decidi que estava na altura... embalei cuidadosamente o vaso, puxei os bancos do carro para a frente e deitei-a nele delicadamente. Fez a viagem comigo para longe da terra que a viu nascer sem saber que iria para um lugar bem melhor. Um pedaço de terra que me pertence, um cantinho de mundo que é meu. Terra boa onde pode crescer tudo. No dia seguinte, Sexta Feira Santa, lá fui com o meu pai e com a minha mãe fazer o transplante. Chegámos... eu levei o vaso, o meu pai a enchada e a pá, uma vara para servir de suporte e cordel, a minha mãe acompanhou de máquina fotográfica em punho para registar aquele momento de comunhão familiar. Então onde é que a queres? perguntou o meu pai Onde é que sugeres, respondi. Ficava bem ao pé da eira e eu concordei.
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Fizemos tudo aquilo juntos... a ameixeira lá ficou, espero que se torne uma árvore grande e que possa um dia comer umas ameixas à sombra das seus ramos numa tarde de início de verão. E recordando um grande momento familiar.
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Nesse pedaço de terra está também um pedaço de sonho... um sonho partilhado por pai, mãe e filho. O sonho de recuperar uma casa muito antiga em ruínas, ter os meus pais a viver lá e a poder gozar os fins-de-semana naquele pacífico cantinho.

100 remos disse...

Um pedaço de terra para um pedaço de sonho.Parece-me perfeito! Let them grow!

Felicidade foi embora
E a saudade no meu peito ainda mora
E é por isso que eu gosto lá de fora
Porque sei que a falsidade não vigora

A minha casa fica lá de trás do mundo
Onde eu vou em um segundo quando começo a cantar
O pensamento parece uma coisa à toa
mas como é que a gente voa quando começa a pensar...

Lembrei-me desta música do Caetano Veloso...the simple things.

Eyes wide open disse...

Também tenho um destes sonhos. Tem vindo a ser constantemente adiado por complexas questões burocráticas. Não fosse por ser a casa dos meus avós e num local tão simpático e não sei se já não teria desistido...

[E que bem que essas ameixas te vão saber!]

*

paula. disse...

Um exemplo bonito de como, por vezes, quase ao acaso, se conseguem construir pequenos momentos que se desenvolverão para afectos e que durarão para sempre.
Vida longa e muito saudável a essa árvore e a quem a viu nascer e (renascer).

Salseira disse...

Um lindo texto que traduz a ideia de um momento especial.

Anónimo disse...

com esta chuvinha vai-se aguentar com certeza!

Beijokas

Anónimo disse...

Acho que ela vai ter saudades tuas e da tua casa! Tens que a ir visitar muitas vezes, falar com ela, senão ela fica triste e deixa de crescer!

Anónimo disse...

São sítios assim que nos fazem sentir vivos, no nosso lar, no nosso canto.

hazey jane disse...

é comovente este post. adoro quando escreves assim, por te sentires assim, parece. beijinho

Maria P. disse...

Lembro-me de "a conhecer" quando ela tinha 20 cm.

Um abraço.

Ana A. disse...

De facto fico encantado com a forma como escreves...

Anónimo disse...

Este Verão já vou poder provar essas ameixas?

Meia Lua disse...

O sonho de certeza vais concretizar... e a ameixeira foi só o começo.. Já escreves num blog, já semeaste e transplantaste a tua árvore... falta-te um filho;) beijinhos

Vladimir disse...

adorei o carinho com que fazes a tua descrição....